quinta-feira, 25 de outubro de 2012

Um poema gritado do peito



Alguns poemas de Rhoselly Xavier




"Arte e poesia são elementos afins que se mesclam ou se complementam e representam a libertação da beleza de muito do que, convencionalmente, se tem por estranho."
 Rhoselly Xavier
  





Poesia

A pouca poesia que há em mim
Se aquece e cresce com a dor
Aumenta o próprio volume
Enquanto explora as entranhas do meu ser
De forma minuciosa e lenta,
Deixando vestígios
De seu domínio crescente
E estimulando os sentidos.
Ela transborda
Como o leite que ferve na leiteira.
Ela se espalha
Como o mais inebriante perfume.
Ela se transporta
Como a música, como o riso, como a vida.
A poesia em mim é pouca,
Mas dinamiza e liberta o meu eu.

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Meu caminho

Um olhar molhado e distante
Um sorriso desentendido
Palavras soltas, desconexas
E tenho todas as pistas,
As que indicam
Que o meu caminho
Não é o que leva a você.

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Tempo

Tudo muda com o tempo
Tudo muda de lugar
Todo o tempo passa a tempo
De algo novo começar.

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Verso solto

Destino é um pretexto
Para os fracos e rendidos
Que ainda não entenderam
Que o que chamam de destino
É apenas verso solto.
Todo dia reescrito.

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Soneto da recaída

Implora para que eu te compreenda.
Sussurra em meu ouvido “Me devora!”
Me beije antes que eu me arrependa
E me solte de teus braços, vá se embora!

Implora pra que eu lembre do passado
E releve o que de triste aconteceu
Insista pra que eu fique ao seu lado
Me engana que teu corpo é só meu

Num delírio de amor inacabado
Num instante de loucura, de ilusão
Quero ter-te uma noite ao meu lado

E reter esse momento em minhas mãos
Pra sentir a sensação de ser amado
Te entregar – última vez – meu coração.

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Setembros passados de chuva

A chuva de setembro
Se perdeu pelas estradas
No passado, bem me lembro,
Contemplava da calçada
O desfile em honra à pátria
Sob chuva e trovoadas
Com o povo da cidade
Numa marcha animada.

Na cidade ou na roça,
Aquela chuva indicava
Que a poeira e o tempo seco
Novamente ao fim chegava
Depois de muitos meses
Sem cair uma gota d’água
Com o gado tão sedento
De água e capim que faltava.


Pela terra esperada,
Um sinal, só pro urubu,
Que a fartura acabava.
Dava vida ao cerrado
Pra alegrar a bicharada
E revitalizar a flora
Que sofrera com as queimadas.


E o Rio Providência
Aumentava o seu volume
Marianas e Piaus
Eram vistos aos cardumes
E o olhar da capivara
Sob a luz dos vaga-lumes
Se expressava a natureza
Viva em cores, sons, perfumes.

O Juá que florescia
Ao pé da cerca da fazenda
Exprimia a alegria
Que chegava de encomenda
Com a chuva de setembro
Ora grossa, ora amena
Transformando o cerrado
Numa viva e linda cena

Na Terra do Abacaxi
Agricultor se animava
Com as flores de pequi
Lá no chão beirando a estrada
Antes da chuva cair
No momento em que ventava
E as mudas de abacaxi
O mais cedo se plantava.

Lá no vidro da janela
Gotas d’água cristalina
Chuva lavando o telhado
E molhando as hortaliças
Cebolinha, salsa e coentro
E algumas ervas finas
Essa imagem tão marcante
Em  minha mente predomina.

O jardim agradecia.
Onze horas que dormia,
Despertava em várias cores.
Era um cenário perfeito
Pra lembrar velhos amores
Como a casa da dona Odete
Com seus cheiros e sabores

Chuva de setembros passados
Se perdeu pelo caminho
Mês de outubro já chegou
Não caiu de água um pingo
Mas o céu está mudando
Avisando que vem vindo
A chuva tão esperada
Para a vida ir ressurgindo.


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Veneno e antídoto


Ironia é veneno
E ao mesmo tempo antídoto
É pólvora das críticas e de certas denúncias
Reflexo tridimensional da hipocrisia,
Dissabor da ignorância
Dinamite da diplomacia
Sustentáculo da percepção
Crítica sagaz e sarcástica da realidade.

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Plenamente

Plena a mente que sonha
Plena a mente que vive
A plenitude de viver os sonhos
De explorar plenamente os sentidos
E em plena explosão de vida
Buscar a recomposição plena
Das sensações e contradições plenas
Da trivialidade e das particularidades
De se viver a vida plenamente.
Plena a mente que o faz.


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Pronome possessivo


Nem minha vida ou meu caminho
Nem minhas dúvidas ou meu esquema
Nem meu canto ou universo
Só meu pranto
Sem meu brilho.
O que não é meu é teu sorriso
Seus rompantes, tua calma
Sua essência, seus conflitos.
Nada nosso, tudo vosso
Sem mesclagem
Meu ou teu... Apenas.


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Unidade


Mãos que se unem
Ombros que se emprestam
Apoio que sustenta
Trabalho de irmãos
Que não são de sangue
Que não são amigos
Que nem se conhecem
Mas que buscam juntos
Um objetivo
Para o bem de muitos
Para o bem de alguns
Para o bem de todos
Para o bem comum

 Mãos que se unem
Ombros que se emprestam
Apoio que sustenta
Trabalho de iguais
Que são solidários,
Que são conscientes,
Que são responsáveis,
Que são diferentes
E que buscam, juntos,
Melhorar a vida,
Ou uma situação
E unindo forças
Concretizam sonhos
Pelo seu trabalho de cooperação.
 
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Cinza das horas, esfera do tempo


                                              
Espera um minuto,
Silenciado,
Versos calados
Que nada dizem,
Que dizem tudo,
Que tudo falam.
Ouça agora
Na esfera do tempo,
Na cinza das horas
Um riso, um lamento.
Espelhos da alma
Projetam uma história
Que vai na memória
Buscar o momento
Que te conheci,
Te quis, te busquei
Que tanto sonhei
Que fosse um bom tempo.
Bom tempo foi ontem
Que te conheci
Bom tempo é agora
Que a minha história
É viva memória
A mais convincente,
Inusitada e sagaz
Melancolia extrema,
Felicidade suprema,
Conflito incessante
De guerra e de paz.
Que nesse instante
Só exista a certeza
De que a vida é uma dúvida,
A morte estranheza
E você o amor
Que agora me apraz
E a minha história
Já não é só memória
Tampouco sem graça,
Tampouco ilusória,
Mas tensa e intensa
De razão que elucida,
Saudade que comprime,
Querer que sufoca,
Voz que o nada suprime,
De forma sublime,
E os versos calados
Que nada dizem,
Que tudo falam,
Que tudo exprimem
E a cinza das horas,
Esfera do tempo,
Silenciado
Por um momento
Que tu nada ouça,
Veja ou toque
Apenas perceba,
Tolere e pressinta
O amor que te cerca
E inebria minha vida.
De tanto te amar
Já não tenho memória
De vida alguma
Que tive outrora
Porque já o tempo
Pra mim não existe
Retenho-o agora
Que você é minha história,
Minha vida, meu tudo
Que nisso insiste
Cativar-me agora
E a cada momento
Na cinza das horas,
Na esfera do tempo.
Que no fim da vida,
irrevogável destino,
Antes de partir
Que te valha a certeza
Do amor que te tive
E nas cinzas das horas
Na esfera do tempo,
Te valha a certeza
Em cada momento
De que não tem fim
A nossa história
Selada de amor
Pra ficar na memória.




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